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UE critica Mercosul e quer ligação direta com Brasil

A União Europeia (UE) tem interesse em criar uma ligação direta com o Brasil para fazer avançar as hoje estagnadas negociações comerciais entre o bloco de 27 países e o Mercosul, sem esperar a Argentina. Na semana passada, o comissário de Agricultura e Desenvolvimento Rural da UE, Dacian Ciolos, disse, em Paris, que a negociação birregional está paralisada, porque não há com quem discutir no bloco sul-americano.

“Com quem discutir? O Mercosul tem ainda coisas a esclarecer no interior dessa estrutura, se ela existe. É preciso que tenhamos um parceiro para poder falar de negociação com o Mercosul. Por enquanto, não é o caso”, argumentou, ao ser questionado se as conversações haviam terminado.

Na mesma entrevista, o deputado Joseph Daul, presidente do Partido Popular, o maior grupo politico no Parlamento Europeu, declarou que o “Mercosul não funciona mais”, criticou a Argentina e manifestou a intenção de uma negociação direta com o Brasil. “Vamos criar no Parlamento Europeu uma ligação direta com o Brasil. Não é normal que um grande pais como o Brasil seja bloqueado no Mercosul por um outro país”, afirmou, em referência à Argentina.

Daul, que é tambem produtor agrícola e esteve no Brasil no mês passado para discutir o tema, afirmou que “o presidente do Parlamento Europeu [Martin Schulz] vai, no outono, provavelmente, colocar em vigor um sistema pelo qual nos vamos trabalhar mais estreitamente com o Brasil, Uruguai e Paraguai, se a Argentina bloquear a discussão”. Segundo ele, Brasil, Paraguai e Uruguai mostram vontade de avançar nas negociações, “mas, no momento, a Argentina bloqueia (…), não é a Europa que bloqueia”.

O deputado europeu disse que a mudança de cenário nos ultimos anos levou a Argentina a segurar as negociações UE-Mercosul. “Quando a carne estava em US$ 1 [o quilo] para o produtor, eles tinham vontade de negociar. Agora, que a carne é vendida lá a € 3,20, eles têm menos vontade de aceitar os produtos industriais e serviços que nos propomos” [em troca de concessões na agricultura]”.

Em círculos da diplomacia brasileira, as declarações de Ciolos e Daul são vistas de várias maneiras. Por um lado, demonstram o reconhecimento da importância da economia brasileira. De outro lado, o discurso de que o Mercosul é complicado, ou inexistente, é antigo e sempre foi usado pelos europeus quando Bruxelas não podia oferecer concessões na área agrícola. Surgia, então, o argumento de que o Mercosul não era um bloco com o mesmo nível de integração da UE.

A experiência com os europeus sinaliza preocupação com a volta desse discurso. Ainda mais quando se sabe que haverá nova rodada de negociações em julho, em Brasília, para o acordo de livre comércio birregional. Uma das ideias é que no segundo semestre, com o Brasil na presidência do bloco, os dois lados troquem novas ofertas de liberalização.

Nesse contexto, a declaração de Ciolos pode ser um recado de que a UE não quer fazer avanços na área agrícola, sem os quais não há acordo entre UE e Mercosul. O mandato europeu para negociar é com o Mercosul, não com o Brasil isoladamente, e isso não vai mudar. E a negociação é feita pela área de comércio da UE, não pela da agricultura, comandada por Ciolos.

As declarações de Ciolos e de Daul podem ser a tentativa de preparar o terreno para nova resistência europeia. Existe a crise do euro e os europeus têm dificuldades para fazer concessões para abrir mercado. Além disso, é conhecida a tática de acusar o outro lado de não estar preparado para concessões, para não se comprometer.

A declaração de Daul sobre a criação de uma ligação direta com o Brasil no Parlamento Europeu também gerou reflexões nos meios diplomáticos. O Parlamento tem uma comissão para as relações com o Mercosul, que não vai acabar. Portanto, não está muito claro como o Parlamento vai fazer em relação ao Brasil.

Se o Parlamento quiser criar agora um grupo para o Brasil, a expectativa é que isso seja feito com habilidade suficiente para que os outros membros do Mercosul não pensem que o Brasil pretenda se contrapor ao bloco. O Brasil sempre sinalizou aos europeus que não tem o menor interesse em ser cavaleiro solitário.

Fonte: Valor Econômico

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