30 de julho de 2012
Uma nova onda de investimentos contagia grandes empresas de saneamento. Apesar de os projetos ainda não terem saído do papel, aportes expressivos estão sendo direcionados para uma área que poderá mudar o setor, com a transformação de resíduos em energia, seja em aterros já existentes ou novos. As vantagens econômicas estão implícitas, com o maior aproveitamento do lixo tratado, porém os custos elevados e a falta de incentivo estatal ainda despertam insegurança com relação à viabilidade dos projetos.
O grupo Estre, do empresário Wilson Quintella Filho, iniciou uma operação experimental em 2011 que, atualmente, passa por um processo de licenciamento com os órgãos ambientais. Instalada em Paulínia, interior de São Paulo, onde a Estre tem seu maior Centro de Gerenciamento de Resíduos (CGR), a unidade é capaz de produzir combustível a partir dos resíduos sólidos do lixo urbano para utilização no processo produtivo (caldeiras e fornos). A usina tem capacidade para processar mil toneladas de lixo por dia, o que corresponde à geração de 500 toneladas ao dia de unidade de valorização de resíduos (UVR).
A Estre investiu cerca de R$ 50 milhões no projeto, entre equipamentos, terrenos e obras. Sem precisar uma data, o diretor de desenvolvimento organizacional do grupo, Alexandre Alvim, destaca que a expectativa é migrar de operação piloto para comercial ainda neste ano. “Estamos explorando diversas frentes, como as cimenteiras, tradicionais usuárias de combustíveis fósseis, e outras empresas que de alguma forma se baseiam em processo térmicos para geração de vapor ou energia”, diz.
Além de Paulínia, a Estre avalia implantar o projeto em outras unidades no Estado de São Paulo, na região Nordeste e na cidade de Curitiba (PR).
A empresa cearense Marquise busca há seis anos uma tecnologia para fazer o tratamento dos resíduos sólidos, mas considera o custo elevado ainda um entrave ao desenvolvimento do projeto.
“As fábricas têm um valor muito alto e, na Europa, os preços que os municípios pagam pelo tratamento não têm referencia com o das cidades brasileiras. A conta não fecha. Os valores que serão gerados para tratar e vender energia não são suficientes para remunerar o dia a dia da fábrica, nem o investimento feito”, afirma o diretor operacional da Marquise, Hugo Nery.
De toda forma, ele avalia que os projetos estão sendo barateados. “Antes, uma unidade com capacidade para queima de 900 toneladas de lixo por dia e geração de cerca de 20 megawatts (MW) de energia custava € 400 milhões. Hoje, o valor está em torno de € 210 milhões”, aponta.
Nesse contexto, a Marquise se associou à Foxx em um projeto no município de Osasco (SP), em que fornecerá os resíduos coletados para geração de energia via tratamento térmico, a ser realizado pela empresa paulista.
Novata no setor de saneamento, a Foxx já anunciou a intenção de investir R$ 3,2 bilhões em cinco anos para implantar 16 Usinas de Recuperação de Energia (UREs) com capacidade para receber 825 toneladas de resíduo ao dia cada.
Uma das maiores do setor, a Foz do Brasil, controlada pela Odebrecht, também pretende entrar nessa área por meio de projetos de tratamento térmico de resíduos. Ela entrou em três PMIs (Procedimentos de Manifestação de Interesse) nas cidades de Mauá (SP), Porto Alegre (RS) e Camaçari (BA) e avalia que, a partir de 2015, terá condições de operar essas unidades.
Já a Essencis, joint venture formada pelos grupos Solví e Estre, está de olho nas oportunidades em biogás no aterro de Caieiras (SP), que recebe 8 mil toneladas de lixo ao dia. A empresa negocia a construção de uma termelétrica e também projeta a operação efetiva até 2015. “A ideia é pegar o metano e utilizá-lo para geração de energia através de motores a combustão”, diz o coordenador de biogás da Essencis Soluções Ambientais, Fernando Freitas.
Na prática, o aterro tem sua vida útil encerrada em 2030, mas pode gerar energia até 2045. A usina teria capacidade para abastecer uma cidade de 500 mil pessoas, com produção entre 25 e 30 megawatts hora (MWh). No pico, em 2030, o volume pode alcançar 40 MWh, atendendo 650 mil pessoas.
Lúcia Coraça, diretora de química e energia da Pöyry, empresa finlandesa especializada na implantação de usinas térmicas a partir de lixo, chama atenção para a saturação dos aterros brasileiros e destaca que a melhor solução para as novas unidades está no processo de incineração.
“O tratamento térmico é o caminho mais adequado técnico e ambientalmente. Mas o que vai estimular esse tipo de investimento é a necessidade, já que ele não tem um retorno tão convidativo”, diz.
O gerente do setor de projetos especiais da paulista Cetesb, Milton Norio Sagabe, destaca o maior potencial de aproveitamento da energia gerada em projetos de tratamento térmico, quando comparado aos de biogás, e chama atenção para seu menor impacto sobre o meio ambiente. “Nos aterros, num bom processo de geração de energia, se aproveita no máximo 70% do gás gerado”, observa.
Fonte: Valor Econômico